ABANDONO DO LAR –
Podemos dizer que a mencionada dúvida advém dos términos das relações conjugais, sejam elas relações conjugais formais, (casamento) ou informais, (união estável).
Atuando na área da família já ouvi inúmeras vezes o questionamento existe o abandono de lar? Ou ainda, se eu sair minha casa, posso perder meus direitos?
Realizando pesquisas para escrever em meu site me deparei com um texto o qual considerei um tanto quanto curioso, o qual fazia a seguinte menção:
“O que pouca gente sabe, incluindo pessoas ligadas ao mundo jurídico que não atuam diretamente com o Direito de Família é que o “abandono de lar”, como era conhecido antigamente, não existe mais”. (grifo nosso)
Certo ou errado?
Do enunciado do artigo 1573, do código Civil, não se pode deduzir que o instituto do abandono de lar foi revogado em nossa Legislação, pois, se encontra ali regulamentado no mencionado Código, ora vejamos:
Artigo 1.573. Podem caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de algum dos seguintes motivos:
I – adultério;
II – tentativa de morte;
III – sevícia ou injúria grave;
IV – abandono voluntário do lar conjugal, durante um ano contínuo;
V – condenação por crime infamante;
VI – conduta desonrosa.
Parágrafo único. O juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum.
É certo afirmar que, o artigo 1573, do código civil, estabelece os motivos que podem impossibilitar a “comunhão de vida”. Partindo do conceito de comunhão de vida encontramos – realização de algo em comum entre os casais –
Destarte, por certo, o abandono voluntário elencando no inciso IV, não pode ser considerado realização de algo comum entre os casais, motivo pelo qual é obvio que o abandono do lar pode caracterizar a impossibilidade de comunhão.
É patente afirmar que para a caracterização do referido abandono existem requisitos, determinados na legislação vigente, qual seja, abandono voluntário do lar pelo prazo de um ano contínuo.
Desta feita, se o ato de “abandono” não foi voluntário, ou não é prolongado no prazo de 01 ano, ou ainda, quando o “abandono” é intermitente, NÃO se poderia caracterizar abandono do lar.
De modo óbvio, para se considerar e ou até mesmo se afirmar se há o instituto do abandono de lar na convivência conjugal se deve analisar, por certo, o caso em concreto.
O que é abandono de lar?
Trata-se do afastamento de um dos cônjuges do lar comum, com a intenção de não mais regressar, pelo prazo mínimo de 1 (um) ano contínuo.
Preconiza o Código Civil:
Artigo 1.511. O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges. (grifo nosso).
Portanto, é inegável que às partes são estabelecidos direito e deveres em grau de igualdade.
Artigo 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I – fidelidade recíproca;
II – vida em comum, no domicílio conjugal;
III – mútua assistência;
IV – sustento, guarda e educação dos filhos;
V – respeito e consideração mútuos.
Manifesto fica que é estabelecido pelo Código Civil que os cônjuges possuem como um dos deveres a vida em comum, no domicílio conjugal.
Artigo 1.569. O domicílio do casal será escolhido por ambos os cônjuges, mas um e outro podem ausentar-se do domicílio conjugal para atender a encargos públicos, ao exercício de sua profissão, ou a interesses particulares relevantes.
A legislação vigente assenta que compete a ambos os cônjuges o direito de escolha do seu domicílio, permitindo a qualquer das partes se ausentar desse domicílio temporariamente por motivos até mesmo particulares relevantes.
Se deve salientar que a doutrina e a jurisprudência vêm apontando como consequência para consideração positiva do abandono de lar em caso prolongado, por um dos cônjuges, o entendimento de que é possível, para aquele que ficou na posse do imóvel residencial, adquirir-lhe a propriedade plena pela via da usucapião familiar estabelecido pela Lei 12.424/2011, sendo respeitados os requisitos existentes no artigo 1240-A, do Código Civil, tema a ser abordado em um próximo post.
O Fato do artigo 1573 do Código Civil, fazer menção de que “podem”, existe divergência do “devem”, pois é sabido por todos que poder não é dever, mas afirmar que “abandono de lar não mais existe” é aparentemente precipitado, devendo ser considerado incorreto.
De todo exposto se deve concluir que, o abandono do lar deve sim ser apreciado pelo judiciário quando requerido pela parte interessada sendo balizada sua decisão para o caso em concreto.